Mais de 150 anos depois de sua publicação original, o livro de “Mulherzinhas” voltou aos (devidos) holofotes com força total. Não que um clássico tão importante quanto esse tivesse caído no esquecimento — Deus nos livre! — , mas é fato que ele ganhou, sim, um novo fôlego graças à adaptação que chegou aos cinemas do Brasil neste mês de janeiro. Com o título de “Adoráveis mulheres”, o filme não deu um novo olhar para a obra de Louisa May Alcott como entrou para a corrida do Oscar com seis indicações, incluindo Melhor Filme.
Mas vamos começar pelo início: do que se trata a história? A autora se inspirou na própria experiência para dar vida à família March, que, em tempos de Guerra de Secessão, acaba sem sua figura masculina. Com o pai longe em missão e a mãe trabalhando para sustentar a casa, as irmãs Meg, Jo, Beth e Amy vivem o processo de amadurecimento que acompanhamos enquanto leitores, indo e vindo pela doçura que toma conta das páginas e o impacto que elas têm até hoje.
O contexto por trás do sucesso
Louisa May Alcott pode ter sido muitas coisas, mas desinteressante nunca foi uma delas. Vinda de um ambiente frequentado por poetas e idealistas, foi abolicionista e feminista, com preferência por escrever sobre mulheres livres, que protagonizavam romances igualmente liberais para a época.
A escritora nunca pretendeu criar um livro como “Mulherzinhas”. Seu primeiro sucesso veio de relatos inspirados em seus dias como enfermeira na Guerra Civil Americana. O investimento no mercado infantil veio estrategicamente para tentar gerar o dinheiro que outros gêneros não trouxeram. Em 1868, depois de muita tentativa e erro, o livro finalmente tomou forma com inspirações generosas nas irmãs Anna, May e Lizzie, parcialmente transformadas em Meg, Amy e Beth, respectivamente. Já a rebelde Jo claramente representa a personalidade de quem a criou, tomando a frente no que se tornaria quase um romance autobiográfico.
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Novas edições nas livrarias
As reedições não poderiam faltar. Desde meados de 2019, as editoras brasileiras têm preparado, anunciado e lançado novas versões de encher os olhos, seja pelo capricho das capas ou pelos diferenciais dos conteúdos extras.
Difícil é escolher uma favorita com tanta variedade. A Editora Zahar, por exemplo, publicou o texto integral em capa dura — que, para completar, vem acompanhado da continuação, 130 ilustrações e uma cronologia. A Editora Planeta investiu no posfácio da espanhola Maria Dueñas, enquanto a o Grupo Companhia das Letras fez o lançamento pelo selo Penguin, com prefácios de Patti Smith e Elaine Showalter. O próximo será o Grupo Editorial Record, cuja edição sairá pela José Olympio.
A releitura de Greta Gerwig
Depois de quase doze versões para televisão, uma ópera, peças de teatro, musicais da Broadway e vários filmes, chegou a vez da diretora de “Lady Bird” (2018) contribuir para a longa lista de adaptações de “Mulherzinhas”. Talvez o grande diferencial seja também um dos grandes méritos de seu trabalho: revigorar uma história mundialmente aclamada com pautas extremamente atuais. Na reta final de uma década marcada por discussões sobre empoderamento feminino, Gerwig encontrou um equilíbrio saudável e aprovado pela crítica.
O elenco inclui Saoirse Ronan, Emma Watson, Meryl Streep e Laura Dern, além de outros nomes de peso. No entanto, tão importante quanto a escolha das atrizes , o tom dado por Greta faz toda a diferença. Dessa vez, as irmãs March representem figuras ainda mais questionadoras, que levantam críticas afiadas não só ao papel da mulher na sociedade, mas também às opções de sustento, status e ascensão oferecidas a elas no século XIX. Só que não para por aí, porque o roteiro dá mais um passo à frente quando mistura a já conhecida história do livro com o que pode ser interpretado como a vida de Alcott.
O filme é um prato cheio para fãs atentos. Portanto, caso você ainda não seja deles, saiba que ainda dá tempo! Sempre dá. Corra atrás da sua edição e venha ver o mundo do livro de “Mulherzinhas” perfeitamente confortável no espaço de destaque ao qual sempre teve direito.
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